domingo, 15 de março de 2009

Ser nu no trânsito

Pedalar no trânsito paulistano é fogo. É o congestionamento, a falta de infra-estrutura, os buracos, os perigos e, principalmente, a falta de respeito. Essa semana me vi em duas situações deprimentes. A primeira foi com uma senhora – detalhe: com uma criança dentro do carro –, que após me fechar e buzinar para mim numa curva, não aceitou a minha “chamada de atenção”, me mandou tomar naquele lugar, disse que lugar de bicicleta é no Ibirapuera e que eu andava num meio de transporte de pobre (!). A segunda foi a fechada fenomenal que um ônibus me deu na Rua dos Pinheiros, que senti minha espinha tremer de ponta-a-ponta.

A sensação que essas situações dão é total falta de proteção. É uma insegurança que faz eu me sentir nua no trânsito, despida de qualquer tipo de segurança, abrigo, que me faça ter certeza que chegarei sem nenhum arranhão em casa.

Aí, o engraçado de tudo isso é que exatamente quando anunciamos que vamos pedalar pelados, o mundo todo parece olhar para nós, os ciclistas pelados.

Hoje a tarde, a Praça do Ciclista estava tomada por jornalistas, policiais, curiosos... tudo para ver os 400 ou 500 ciclistas que apareceram por lá para participar do World Naked Bike Ride, a Pedalada Pelada de São Paulo. A proposta: chamar atenção para os ciclistas no trânsito, protestar contra o consumo absurdo de combustíveis fósseis, celebrar o corpo, a vida, a felicidade, a bicicleta...

E chamamos a atenção. Parece que, de repente, como num passe de mágica, todos passaram a nos olhar, nos enxergar, como se fossemos tão gigantes quanto o congestionamento de carros no trânsito de São Paulo. De um lado a imprensa nos mirava com suas câmeras, erotizando a ação. Do outro lado a polícia, nos mirando como se fossemos obscenos e quiséssemos atentar a algum pudor... Me pergunto se para ver pessoas peladas não basta ligar a televisão no horário nobre e assistir as cenas mais absurdas de erotismos, machismos e obscenidades. Como se obsceno não fosse essa poluição diária, causada em grande maioria pelos veículos, esse trânsito caótico que deixam as pessoas malucas e doentes – como a mulher que me xingou, como o motorista de ônibus que quase me matou... – como se obsceno não fosse a corrupção, a fome, a (falta de) educação...

Mas nem imprensa, nem polícia, ninguém conseguiu estragar a festa. Foi lindo! Anunciamos um trajeto e no meio do caminho nos dispersamos em pequenas massas de cinco, dez, quinze ciclistas e nos encontramos em outro lugar. Bem mais calmo, bem menos banalizado, onde pudemos continuar com a nossa mensagem, invadir as ruas da cidade, cantando, gritando, sorrindo, pelados, seminus, vestidos, mas, pedalando. Pedalando e chamando muita atenção.

Por onde passávamos, havia gritos, comentários, perguntas, curiosidades, buzinas, fotos...

Quem me dera se todos os dias eu fosse enxergada desse jeito! Será que preciso ficar nua no sentido literal para ter um espacinho um pouquinho maior nesse trânsito?

Bom, ao menos, pedalar pelada não é nada mal!!!


Fotos no: http://picasaweb.google.com.br/EvelynAraripe/WNBRPedaladaPelada#

Tinha imprensa (Foto: Isaac Akira)

Tinha polícia (Foto: Isaac Akira)

Tinha ciclistas... (Foto: Isaac Akira)

... pedalando pelados!

17 comentários:

  1. Oi, bonito relato, um dia conseguiremos o respeito a que temos direito. E essa mulher vai ter muito problema com seus filhos ainda. Um bom dia,
    matias

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  2. Belo texto! Triste por não poder estar lá, feliz por ver que a mensagem foi passada. E vamos trabalhar com os bons entendedores, os outros que fiquem felizes em seus congestionamentos, cada vez maiores.

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  3. Putz Evelyn... eu fiquei passada com essa mulher que te xingou... transporte de pobre! Transporte de pessoas conscientes! Mas enfim. Não fui protestar porque estou presa em casa. Com um trabalho para entregar amanhã... 1500 curriculos para serem analisados... já analisei uma boa parte durante a semana... mas tinha que finalizar.
    Bem, amei seu relato. como sempre escreve com a alma e deixa aqui um gostinho mais feliz de morarmos em São Paulo.
    beijo linda!
    até

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  4. Evelyn, que texto bacana... não sou bom ciclista, mas fiz questão de participar da festa e segui a turma até o Ibirapuera. Foi sensacional!!!

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  5. É docinho, ontem foi perfeito!!! Melhor que os filmes de "róliudi"!!! Lembrei da cena dos velozes e furiosos na cena da dispersão, só faltou o globocop. O grupo que eu estava debandou por tras do colégio bandeirantes enquanto outras galeras sumiam pela cubatão e outras ruas. Foi demais!!!

    Pra terminar fomos no espetinho, pena que não foste... Fez falta.

    beijocas

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  6. Sei que na hora que acontece a gente nunca pensa numa boa frase, mas na próxima você pode responder que se o seu é de pobre, o dela é de pobre de espírito... Outro dia, discutindo com um milionário que tentou me matar, ele lançou essa: "não acredito que eu to discutindo com um ciclista". A resposta, na lata, foi: "pra você ver o quanto você tá sendo ridículo".

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  7. Abelinha!
    O WNBR deste ano foi o melhor, o drible nos canas foi memorável. Todo mundo livre, o monumento dos bandeirantes virou uma praiaciclonudista, manifestação, expressão diversão... Demais!

    Beijo

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  8. observando de vista panoramica, distante mas por aqui... sensacional ...
    viny

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  9. Inveja por eu não poder estar com vocês.

    Um cara que trabalha comigo, disse que o ônibus dele demorou mais de uma hora pra chegar por causa do wnbr, mas pro meu espanto ele disse que se não fosse trabalhar e soubesse antes do evento teria ido também.

    Mais um potencial cicloativista.

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  10. Poxa perdi a pedalada, que dureza!
    Mas aí, na proxima estaremos la.
    Inté procês!

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  11. Engraçado que estamos em nossa própria pátria, somos autenticamente brasileiros, filhos desta terra tão gentil, e deparamos com a mais antiquada ditadura de como temos que pensar, ser, se vestir, falar, expessar. Em resumo somos robôs manipulados e programados para ser exatamente como o DITADOR manda, em países muito mais evoluidos esse passeio WNBR é feito de forma tão democrática e sem repressão. Afinal que mal existe em uma pessoa (livre por nascença) andar nua onde quer que ela queira, sabendo se comportar perante os demais. Se fosse a vontade de Deus que vivessemos nús, nasceríamos assim.

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  12. È triste pq precisamos chegar ao extremo para ter uma resposta....por outro lado da orgulho saber que não somos os únicos a defender direitos como esses!!!!! Amei!!!!

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